Uma linda menina, loira, olhos verdes, 1,80m. de altura, radiosa nos
seus 17 anos, boa aluna, aspecto ultra saudável, a quem uma doença
inesperada do foro genético obrigou a uma operação radical, tal a
gravidade do diagnóstico. Foi muito difícil explicar-lhe, no
esplendor da sua idade, uma esterilidade tão precoce.
Quis o destino que ela conhecesse um rapaz, médico, com quem casou
aos 22 anos. Ele sempre soube da sua "estória" de vida. Quatro anos
após o enlace resolveram candidatar-se a uma dupla adopção: deram
preferência a irmãos/ãs em que o/a mais novo/a tivesse até 2 anos de
idade.
O processo foi longo e penosa a espera. Toda a família esteve
envolvida e com igual ansiedade esperava... E eis senão quando, às
16h. de um vulgar dia de semana, se recebeu um telefonema para que,
no dia imediato, às 12h. se estivesse em determinado local oficial
para recolher uns gémeos, com 28 dias de existência na incubadora...
Foi um parto de 20 horas, em que todos tiveram dores e se viraram do
avesso: foi um enxoval apressado, foram lágrimas de alegria, foi uma
noite sem sono, foi a "adivinhação" do cheiro e dos traços, foi o
trabalho profissional interrompido, foi uma angústia do dia seguinte
que não mais chegava... foi... foi...
E às 11,45h. do dia marcado lá estavam três pessoas: um casal de
pais e uma avó com a experiência prática de ter sido mãe. Quando por
fim os dois bebés entraram na sala em que se aguardava, a
mãe "paralisou e estarreceu" de felicidade. A avó arrancou o
primeiro bebé dos braços que o transportavam e o pai agarrou o
segundo com unhas e dentes. Cabiam no antebraço. Tinham
respectivamente 1,700kg e 1,800kg. Os três só queriam mudar-lhes a
roupinha a 500km à hora e fugir até casa com eles colados ao peito.
Não há descrição escrita possível para a emoção desse momento.
Talvez só um pequeno detalhe dê uma ideia muito longínqua do
turbilhão emocional que se viveu: as duas máquinas fotográficas que
se levaram, disparadas sem rei nem roque, afinal não tinham rolo...
só flash… Creio que se tivessem rolo as fotos estariam focadas nos
tectos, paredes, sapatos, enfim em tudo menos no objectivo.
Nunca existiram os preconceitos do tipo sanguíneo e da memória
celular. Ninguém se lembrou deles, pura e simplesmente. Sem dúvida,
querer um filho é muito mais forte do que ter um filho.
Também ninguém se arrependeu e faria tudo novamente. Até tentaram… a rapariga…
E estes gémeos cresceram com boas raízes, tronco robusto, saudáveis
galhos e folhas viçosas. Têm hoje 13 anos. São brilhantes alunos,
embora do mais irrequieto que se possa pensar. São amados até ao limite e sempre em pé de igualdade por toda a família, avós, tios/as, primas. Com o avançar da idade e porque são dizigóticos,
começaram a distinguir-se em tudo. E não é que um é parecido com o
pai (até quer ser médico) e o outro tem sinais físicos da mãe? É o
tal mimetismo…
Eu acredito, do fundo da minha alma, que os seres humanos mais interessantes são diferentes...